Suzi Huff Theodoro
Pesquisadora da Universidade de Brasília
suzitheodoro@unb.br
Cuidar da nossa casa comum, o planeta Terra, é uma tarefa de todos seus habitantes. Os animais, os microrganismos e as árvores já fazem este serviço sem pestanejar, porque este vínculo e interação é intrínseco de seus DNA. Vivem em sintonia, em sinergia e em simbiose extraindo o que precisam sem comprometer o estoque que lhes garante a vida e reprodução. Mas é certo que também retribuem o que consomem, por meio de uma poderosa ciclagem de nutrientes, conduzidas especialmente na zona das raízes. São elas, as artérias desse poderoso ciclo de desgaste e renovação.
Os humanos costumam dizer que essa tropa silenciosa (de animais, plantas, microrganismos etc.) não foi contemplada pelo beneficio da inteligência e que sua reprodução e especiação deve-se exclusivamente a mecanismos de evolução natural. Neste sentido, fico me questionando sobre o que é de fato a inteligência e sobre os tais critérios que nos permitem escolhas – razão ao invés de instinto.
Como não duvidar dessa tal privilegiada inteligência humana que, no extremo, está nos levando a um caminho sem volta de autodestruição? Apesar da prerrogativa das escolhas (razão), uma grande parte da espécie humana prefere dilapidar ao extremo os recursos tão generosamente disponibilizados pela nossa Pachamama, opta pelo lucro rápido – mesmo que as custas da depreciação dos bens que são sabidamente finitos – e elege o consumo exacerbado como parâmetro de sucesso – ainda que isto signifique a miséria para muitos que não têm o mesmo poder de escolha.
Para saciar sua ganância usam de meios espúrios para dominar e submeter quem possa lhes confrontar. Apropriam-se de forma ilegal e predatória das riquezas que lhes garantem uma vida de consumo afrontoso. Como piratas e corsários, não excitam frente aos limites naturais, estabelecidos pela finitude da própria terra. Nesse embate desigual, o cenário é de mortes em massa, seja pela gula ou pela fome.
Mas há esperança. Algo parece estar mudando. A crise que se avizinha, dada pelo aquecimento do clima no planeta, o risco de eventos extremos em qualquer local (seja no norte ou no sul global), a fome e a violência generalizada despertam a compaixão entre os mais jovens e, em especial, em meio as crianças. Ainda que sem a consciência do que está por vir, essa novíssima geração parece estar chegando com um novo “chip”, onde já está gravado e selado o compromisso de preservação dos bens ambientais que sustentarão seu futuro.
Nessa trilha da mudança já programada, percebem que é preciso cuidar do solo e potencializar as suas interações. Questionam o uso de agrotóxicos que envenenam o ar e as águas. Querem ampliar e praticar a agroecologia como modelo de vida, porque esse é o caminho mais curto para reconectar os seres humanos com a terra. E, encantados, descobrem que na contramão de um sistema de produção que defende a domesticação de plantas e a uniformização de práticas, de insumos e de tratos culturais (que invariavelmente resulta em uma erosão genética dos recursos ambientais), aparece uma opção tecnológica, que resgata a forma mais simples de produzir alimentos. Maravilhados, descobrem a simplicidade da tecnologia da rochagem, que tem como principal pressuposto o rejuvenescimento do solo por meio da sua remineralização obtida pelo uso de rochas moídas. Inteligentes que são, já sabem que os solos derivam do desgaste das rochas, seja por processos físicos ou pela atuação de microrganismos que se alimentam diretamente dos nutrientes presentes nos minerais formadores das rochas. Desvendam a história e descobrem que essa técnica agrícola já era praticada pelos povos originários (Incas, Zulus, Maoris e Celtas entre outros), mas que por interesses espúrios foi sendo propositadamente apagada das memorias coletivas da humanidade pela modernidade reducionista e tecnicista.
Mas as crises (sempre elas!) possibilitam novos olhares e caminhos. E esse “exercito juvenil” descobre que produzir alimentos saudáveis, capturar carbono da atmosfera e salvar a terra pode ser um processo simples e lúdico. Entendem que usar os pós de diferentes tipos de rochas trás benefícios simples de compreender e de praticar. Fertilizarão a terra com a própria terra. Os jovens recrutas deste imenso exército divertem-se praticando a sustentabilidade, na real acepção da palavra. Espalham pós de rocha como se fossem ventos da primavera espalhando pequenos cristais luminosos que fecundarão os solos com as sementes do bem viver. Entre brincadeiras e risos, sonham com um porvir menos complexo e mais generoso. Que assim seja!
Este texto é dedicado as tantas crianças que encontrei nas minhas andanças falando e praticando a rochagem pelo mundo e que se encantaram pelo poder das rochas e pelos mistérios do solo. Todo meu reconhecimento para o Louis, Pedro, Dionisia, Paula, Nathan, Christipher, Annabel, Elise e tantos(as) outros(as).
Com respeito e gratidão. Vamos remineralizar o mundo.