Agricultura Regenerativa e o reequilíbrio das funções ecossistêmicas do solo: como os remineralizadores podem ajudar?

Mais de 500 anos depois de Pero Vaz de Caminha se equívocar em sua carta ao rei Dom Manuel de Portugal, escrevendo “Nesta terra, em se plantando, tudo dá!”, aprendemos que não é bem assim, e avançamos: desenvolvemos ciência e tecnologia para inovar em novas formas de cultivo em solos ácidos do cerrado, adaptamos cultivos às condições edáficas (tropicalização), plantio direto na palha protegendo o solo e a fixação biológica do nitrogênio na soja. Porém, a 4° Revolução Agrícola exige mais, segundo o ganhador do Prêmio Nobel, Steven Chu.

De acordo com FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), a agência especializada do Sistema ONU que trabalha no combate à fome e à pobreza por meio da melhoria da segurança alimentar e do desenvolvimento agrícola, cerca de 33% dos solos do Planeta estão degradados e todo ano perdemos uma área quase do tamanho da Croácia ou da Costa Rica por não cuidarmos bem do solo. Se mais de 90% do que consumimos de um jeito ou de outro vem do solo, segundo a Embrapa, como iremos nos preparar para alimentar, gerar energia para locomoção, fibras para roupas e medicamentos para 10 bilhões de pessoas até 2100? Só faltam 78 anos, uma geração!

As três primeiras Revoluções Agrícolas permitiram que milhões de pessoas não morressem de fome e que a qualidade de vida de muitas famílias melhorasse, porém muito ainda precisa ser feito. Steven Chu , ganhador do Prêmio Nobel de física, cientista na Stanford University na área de fisiologia e alimentos, comenta que a Quarta Revolução Agrícola é necessária. A primeira revolução agrícola foi marcada pela domesticação das plantas e animais, a segunda teve como marco a melhoria de ferramentas e processos como arado e a rotação de culturas. A terceira revolução foi impulsionada pelo desenvolvimento de fertilizantes.

É inegável que as Revoluções Agrícolas transformaram não só a cultura agrícola, mas influenciaram na história da humanidade no campo ou nas cidades, seja na atividade familiar ou em grandes empresas, governos e fundos. Desde as primeiras ferramentas de pedra na agricultura até migrarmos para novos sistemas produtivos utilizando 5G, nanotecnologia, genética, remineralizadores e outros agrominerais regionais, um fator ainda é o mesmo: o solo. É inegável a importância dessas revoluções para o desenvolvimento da civilização e vida das pessoas. Porém, elas também geraram consequências, especialmente no solo, um dos maiores ativos de um país e de empresas de diferentes seguimentos. Afinal, já imaginou um mundo sem fibras para roupas e itens da área da saúde, sem bioenergia para carros, motos e até aviões? Um mundo sem proteína animal ou vegetal? Pois é, tudo isso e muitas outras coisas que movimentam a economia, educação, saúde, lazer e empregos vem do solo e indiretamente das rochas, a “mãe do solo”.

A pandemia, metas da Agenda 2030, intensificação dos eventos extremos provocado pelas mudanças climáticas e as crises geopolíticas globais, intensificaram a interação digital-biológico para solução dos desafios do Planeta Terra. A demanda gerada por um novo perfil de consumidores globais, cada vez mais conectados e preocupados com a saúde do ecossistema, também acelera o surgimento de serviços ecossistêmicos. Alguns dos serviços ecossistêmicos do solo estão relacionados à: (i) regeneração, manutenção e melhora da capacidade de armazenamento de água impactando na resiliência hídrica; (ii) reequilíbrio da vida microbiológica do solo como fungos e bactérias benéficas ao desenvolvimento das plantas e ciclo biogeoquímicos de diferentes elementos como carbono e nitrogênio; (iii) garantia da segurança alimentar e estabilidade da sociedade provendo alimentos, fibras, energias e medicamentos.

Ao longo dos anos da evolução da civilização e das diferentes gerações, muitas melhorias e descobertas foram sendo feitas na agricultura. Apesar de vivermos a era da agricultura digital, controle biológico, robôs na agricultura e aplicativos, uma tecnologia de extrema importância para agricultura tropical é a calagem. A calagem é uma boa prática de gestão agrícola utilizada para melhorar a performance do solo quanto à disponibilização de nutrientes para as plantas. A má gestão da calagem pode ter diferentes desdobramentos ao longo de toda safra: baixo aproveitamento de insumos, desequilíbrio nutricional na planta acarretando maior suscetibilidade a pragas e doenças, baixa produtividade e qualidade da produção. O que é a calagem, talvez uma das maiores inovações para viabilizar agricultura tropical, senão “aplicação de rocha moída no solo”, ou seja, a prática da Rochagem.

Os remineralizadores fazem parte desse pacote tecnológico para agricultura tropical que vem evoluindo para melhorar a performance agrícola dos solos brasileiros. Os solos e as rochas são formados de estruturas minúsculas do tamanho do covid19 chamadas de minerais (tamanho nanométrico que equivale a um milímetro dividido mais de mil vezes). Quando há interação dos minerais da rocha, com os minerais e os microorganismos, novos minerais podem ser formados no solo melhorando suas funções ecossistêmicas. Os cientistas brasileiros foram os primeiros a mostrar para o mundo que esses minerais naturais do solo variam em tipo e quantidade em um pequeno espaço de área (menos de 1 hectare). Também foram os pioneiros a mostrar o impacto desses minerais em ações de manejo na prática, como compactação do solo, adubação fosfatada, potencial para erosão e na resposta das plantas. Agora, mais uma vez, a ciência brasileira, especialmente os cientistas da gênese dos solos tropicais, mostram para o mundo que a interação remineralizadores e solos pode ser o próximo salto da 4° Revolução Agrícola e do reequilíbrio das funções ecossistêmicas do solo. Se é no solo que tudo começa, é da rocha que nasce o solo!

Por: Diego Silva Siqueira

Engenheiro Agrônomo, Cientista do Solo, Professor no Programa de Pós-graduação em Ciência do Solo da Unesp Jaboticabal, no Programa SolloAgro da ESALq-USP e Diretor Executivo da Quanticum

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