Artigo – Alterações químicas no solo promovidas por remineralizadores

Augusto Luchese
Engenheiro Agrônomo, professor na UFPR. Membro do Conselho Técnico da ABREFEN.

Introdução

Por definição, remineralizadores são materiais de origem mineral que tenham sofrido apenas redução e classificação de tamanho de partícula por processos mecânicos e que, aplicados ao solo, alterem os seus índices de fertilidade, por meio da adição de macronutrientes e micronutrientes para as plantas, e promovam a melhoria de propriedades físicas, físico-químicas ou da atividade biológica do solo (MAPA, 2013).

Num primeiro momento, entende-se, então, que reminera-lizadores são rochas constituídas por minerais que apresentam na sua composição elementos considerados como nutrientes ou benéficos para o desenvolvimento das plantas e que auxiliam no desenvolvimento das plantas por meio de sua liberação.

Contudo, outros benefícios ocorrem no processo que geram melhorias em outras propriedades químicas do solo como CTC e PH, sem contabilizar os inúmeros benefícios físicos e biológicos que fazem parte deste processo de remineralização do solo.

Embora o artigo seja restrito às melhorias químicas do solo promovida pelos remineralizadores, é importante frisar que a moagem adequada do material será fundamental para o desempenho deste produto, pois ela permite a liberação de macro e micronutrientes, favorecendo que no momento em que é acrescentado no solo sofra a ação biológica e de ácidos orgânicos (RAMOS, 2014).

Swoboda et al (2022) descrevem que embora algumas imperfeições na estrutura cristalina de alguns materiais possam gerar variações, estas tendem a não ser equivalentes à reatividade da área superficial específica. Assim, é fundamental que o remineralizador apresente uma tamisação adequada para que este reaja no solo num tempo adequado.

Liberação de nutrientes

É importante ressaltar que existem dezenas de rochas no Brasil que poderiam ser utilizadas como remineralizadores e que muitas vem sendo objetos de estudos, como o basalto, diabásio, fenolito, fosforito, brecha, biotita, chisto, entre outras (ALOVISI et al., 2017; DA SILVA et al., 2017; TOSCANI e CAMPOS, 2017; MARTINS et al., 2015, SILVA et al., 2012).

Contudo, embora existam estudos com diversos materiais, o número de dados gerados a respeito da prática da remineralização é pequeno se comparado à literatura existente para fertilizantes solúveis. Somado a isto, há diferenças significativas tanto entre as rochas como dentro de uma mesma rocha, dependendo de seu local de origem, gerando, portanto, uma demanda de estudos específicos para cada material oriundo de uma mineração.

Dentre as melhorias do solo, temos o incremento dos teores de macro nutrientes como cálcio, magnésio, fósforo e potássio (RIBEIRO et al., 2010; MELO et al., 2012; MANCUSO et al., 2014; MARTINS et al., 2015; LUCHESE et al. 2021). Quatro são os macronutrientes que apresentam respostas com a aplicação dos remineralizadores sendo estes Ca, Mg, P e K. Incrementos nos teores de Ca no solo pelo remineralizador são encontrados na literatura sobre rochagem, demonstrando que o cálcio é potencialmente liberado por estes materiais (LUCHESE et al., 2021; DA SILVA et al., 2017; MELO et al., 2012; SILVA et al., 2012; RIBEIRO et al., 2010).

Embora possam ocorrer em pequenas quantidades na forma de carbonatos, a presença de silicatos de cálcio como Andesina, Labradorita e Augita são frequentes e, consequentemente, tendem a ser os principais responsáveis pelo cálcio liberado no solo, uma vez que, dentro dos materiais silicatados, os silicatos de cálcio são caracterizados como mais reativos, já que o Ca apresenta ligações mais fracas com o Si em comparação ao Mg, K e Na (KELLAND et al., 2020, ANDA et al., 2015).

A disponibilização de Mg para o solo por remineralizadores tem apresentado resultados distintos, pois embora alguns autores tenham obtido incrementos dos teores de Mg no solo com a aplicação de remineralizadores (MELO et al., 2012; RESENDE et al., 2006), existem trabalhos que também não verificam incrementos, ou apresentam até mesmo reduções nestes teores (LUCHESE et al., 2021; RIBEIRO et al., 2010).

Para Swoboda et al. (2022), existem tanto trabalhos com resultados positivos quanto sem resultados com relação a Ca e Mg, mas, em sua revisão lietrária, respostas positivas de Mg com a aplicação de remineralizadores são mais frequentes que as com liberação significativa de Ca.

Se observarmos a liberação de potássio dos remineralizadores, a literatura demonstra que existem respostas significativas com relação aos teores de K no solo e tecido. Swoboda et al. (2022) verificaram respostas significativas de K no solo em 67,5 % dos trabalhos avaliados. Em alguns trabalhos, inclusive, a resposta de K no solo e tecido varia com a aplicação do mesmo remineralizador, dependendo do tipo de solo e cultura semeada (LUCHESE et al, 2021).

Dentre as rochas utilizadas como remineralizadores, existe grande variabilidade nos teores de K nelas, bem como a maneira como o mineral irá disponibilizar este K. Pela legislação, os materiais para serem comercializados como remineralizadores devem apresentar uma quantidade mínima de 1% de K2O (MAPA, 2013), contudo, alguns materiais irão estar nesta faixa de 1% e outros com concentrações bem maiores próximos a 5%, como no caso de biotitas (Resende et al., 2006).

Por outro lado, as taxas de dissolução também são importantes. Se considerarmos o ortoclásio como mineral base de fonte de potássio, uma Leucita, que apresenta composição química semelhante ao ortoclásio, pode apresentar uma taxa relativa de dissolução 11.500 vezes maior, comparando este com micas, tem-se que a muscovita apresentaria uma taxa de dissolução relativa de 0,016, ou seja, 63 vezes menos solúvel que o ortoclásio, enquanto uma biotita teria uma dissolução 1,66 vezes maior (SWOBODA et al., 2022).

O aumento no teor de P do solo pela aplicação de pó de rochas também foi observado por outros autores, tanto avaliado por Mehlich I (LUCHESE et al., 2021, MARTINS et al., 2015; SILVA et al., 2012; DA SILVA et al., 2011; RIBEIRO et al., 2010), quanto avaliado por resina (MARTINS et al., 2015; RESENDE et al., 2006).

O aumento dos teores de P no solo pode estar vinculado diretamente a presença deste nutriente no remineralizador, na forma de apatitas em alguns materiais que, mesmo sendo baixos, contribuem para estes pequenos incrementos (LUCHESE et al., 2021) ou por dois outros efeitos indiretos que ocorrem com a aplicação de remineralizadores, sendo eles o aumento do pH e a entrada de óxido de silício no sistema, que competiria com os sítios de adsorção do fosfato (ALLEONI et al., 2019, CORNELL e SCHWERTMANN, 2001; MATICHENKOV e BOCHARNIKOVA, 1996).

Outras propriedades do solo.

Incremento no pH é um dos efeitos esperados devido a vasta literatura que demonstra este benefício com o uso de remineralizadores (LUCHESE et al., 2021; SOUZA et al., 2017, TOSCANI e CAMPOS, 2017; MELO et al., 2012; SILVA et al., 2012; RIBEIRO et al., 2010).

Cabe pontuar que este efeito corretivo do remineralizador não ocorre da mesma forma que o calcário. Enquanto o efeito do calcário é devido à reação dos carbonatos de cálcio e magnésio que o constituem, o remineralizador promove o aumento do pH pelo consumo de H+ na reação de intemperismo dos silicatos. É esperado um efeito mais rápido quando ocorrem maiores quantidades de silicatos de Ca, sendo seguidos pelos silicatos de Mg, Na e K, pois, como já explanado, estes apresentam maior reatividade (KELLAND et al., 2020, ANDA et al., 2015).

Também é verificado que as transformações dos minerais primários constituintes destas rochas, a exemplo da biotita, sofrem as transformações naturais de seus processos intempéricos, formando minerais secundários 2:1, como a vermiculita (MOHAMMED, et al., 2014), promovendo desta forma um ganho de CTC nos solos tratados com estes materiais (DA SILVA et al., 2017; TOSCANI e CAMPOS, 2017).

É muito importante frisar que os solos brasileiros são muito intemperizados e, por este motivo, caracterizados por minerais de baixa CTC. Para a melhoria desta característica, focava-se muito em aumentar os teores de CO (carbono orgânico) nos solos, devido a importância desta propriedade nas características de fertilidade. O aumento da CTC pela aplicação de remineralizadores amplia as opções de ganhos de CTC, tanto pela formação de novas fases minerais de maior CTC, quanto dos ganhos de CO, que ocorrem também pela interação destes novos minerais com a matéria orgânica.

Referências:

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MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Altera o Anexo ao Decreto nº 4.954, de 14 de janeiro de 2004, que aprova o Regulamento da Lei nº 6.894, de 16 de dezembro de 1980, que dispõe sobre a inspeção e fiscalização da produção e do comércio de fertilizantes, corretivos, inoculantes ou biofertilizantes destinados à agricultura. DECRETO Nº 8.384, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2014. Brasília-GO.
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